sábado, 17 de setembro de 2011

Cantigas de Roda

Terezinha de Jesus

O Primeiro me chegou como amigo.
Conversamos sobre tudo.
Vivemos aventuras.

O Segundo me chegou como marido.
Planejamos sobre tudo.
Tivemos filhos.

O Terceiro me chegou como amante.
Amamos tudo.
Criamos nada.

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Atirei o pau na outra
Mas, a outra não morreu
Dona Chica admirou-se
Com o estrago que ela fez.

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Fui na Espanha
buscar a minha cabeça
Rosa e vermelho
Da cor do meu coração.
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Autor:
Simone da Silva Figueiredo
(escrito em: 15/09/2011)

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Keith

Simone, Claudia e Erica rompem pelo portão da casa de Itaipu. Dezessete, dezesseis e quinze anos de pura eletricidade. Atrás delas a voz forte de Luiz anuncia: "Djalma, chegamos!". Simone é filha de Luiz. Claudia é filha de Cinéa. E Erica é filha de Djalma. As três são além de amigas, primas. Luiz, Cinéa e Djalma são irmãos. E assim inicia-se mais um delicioso final de semana na casa do tio.

Djalma chega atraído pelos chamados e pela balbúrdia que o grupo cria na casa antes silenciosa. Djalma tinha alugado a casa de quatro pavimentos para ele e a terceira esposa – daqui a alguns anos ela virá a ser chamada de Tia Rita apesar de ter apenas um pouco mais de vinte anos. Ele tem mais de duas décadas que ela, mas no coração ambos tem a mesma energia e alegria pela vida. Eles ainda não tinham filhos, mas Djalma tinha três meninas do primeiro casamento (Andréa – 17, Erica – 15 e Adriana – 11) e dois meninos do segundo (Henrique – 9 e Guilherme – 17). A casa tinha de ser grande, sua família é grande.

Luiz retira Djalma dos pensamentos.

_ Mano, aonde coloco as coisas para o churrasco?
_ Dê a Rita. Ela está na cozinha.

Djalma olha para as meninas e grita:
_ Erica! Venha abraçar o papai. Simone e Claudia venham com o tio. Cadê a Adriana?
_ Tio, ela está dormindo no carro. Meu pai já vai buscá-la.

Adriana chega correndo.
_ Acordei.

Djalma estão anuncia:
_ Tenho uma surpresa para vocês. Venha Luma!

Nisso adentra no pátio superior um pastor alemão manto negro enorme. Coloca as duas patas no peito de Djalma e lhe lambe a face. Djalma é um homem negro, forte de 1.80 m de altura. A cadela se aproxima de nós. Ficamos com medo.

E Djalma diz:
_ Ela é de vocês. Podem brincar a vontade. Ela é mansa.

E foi assim que conheci a mãe da minha primeira filha. Alguns anos depois ganhei a Keith de Luma. Próximo do meu aniversário de 23 anos.

Autor:
Simone da Silva Figueiredo
(escrito em 09.09.2011
fato ocorrido em algum final de semana entre 1987 e 1988)

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Um anjo em minha vida

Simone saía todos os dias da faculdade. Na intenção de apressar o seu retorno, sempre pegava carona. Certa noite, uns colegas de classe ofereceram carona para próximo da sua casa. Teria ainda de pegar uma condução. O que Simone não sabia é que a linha de ônibus pretendida tinha o último horário muito cedo.

Desceu do carro e seus colegas continuaram no caminho. Tomou a direção da parada de ônibus, ao chegar perguntou aos demais sobre a condução que desejava. Teve a triste notícia que o último carro havia passado à meia hora. Ninguém sabia lhe informar como chegava a sua residência. Com o adiantado da hora começou a temer pela sua segurança.

Simone começou a olhar à esmo. Em seus olhos uma lágrima teimava em sair. Então, ela reza. Declama baixinho o Salmo 23 e pede à Deus que acampe os seus anjos ao seu redor, como a avó havia lhe ensinado. Suas preces não chegaram ao fim quando ela avistou um rapaz alto, forte e moreno se aproximando. Ele estava vestido de branco e carregava uma pequena valise. Chegou se apresentando.

_ Boa noite, Simone. Meu nome é Marcelo. Posso lhe ajudar?

Atônita, Simone responde:

_ Obrigada. Você sabe que ônibus eu posso pegar? Preciso ir para casa.

Conversaram e ela lhe explicou onde residia e que fazia faculdade. Ele lhe contou que era estudante de medicina na mesma Universidade que ela e que estagiava na unidade local dos "Anjos do Asfalto". Não tardou e outra condução chegou. Ela agradeceu e partiu. Ele parecia vigiá-la.

No dia seguinte, ela resolveu procurá-lo no hospital da faculdade. Queria muito lhe agradecer por tê-la mantido calma e a feito chegar em segurança na sua casa. E como ele havia dito que era seu dia de plantão, calculou que isso não seria um problema.

Procurou-o na unidade de traumatologia. Recebeu uma notícia chocante. Marcelo morreu há alguns meses. Ele estagiava na unidade dos "Anjos do Asfalto" e era um excelente aluno.

Simone entendeu. Marcelo foi o anjo enviado por Deus.


O Senhor é o meu Pastor, nada me faltará.

Senhor, Meu Deus, estou com muito medo. Acampe seus anjos ao meu redor. E, por favor, dê ordens a eles para que cuidem de minha segurança.

Pai nosso, que estais no céu. Santificado seja o Vosso nome. Venha a nós o Vosso reino. Seja feita a Vossa vontade, assim na terra como no céu. O pão nosso de cada dia nos dai hoje. Perdoai os nossos pecados e não nos deixeis cair em tentação.

Amém

Autor:
Simone da Silva Figueiredo
(escrito em 09.09.2011
fato ocorrido em 1994)

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

A Igreja

Thiago adentra a nave da igreja. A pequena construção do século XVI se mantém de pé; apesar do castigo do tempo, através dos açoites das intempéries. A nave de teto elevado aonde ainda era possível avistar desenhos de anjos, tinha buracos por onde a chuva caia em cachoeira.

Thiago buscou abrigo para a chuva. Achou que a igreja seria um lugar seco e seguro. Seu corpo era sacudido pela febre e a dor que a falta de alimento trazia. Se aproximou daquilo que foi um dia um belo altar e que tinha a qualidade de ser o ponto mais seco da igreja. Adormeceu em meio as dores.

Thiago ouviu chamar seu nome. Acordou e viu a mais bela igreja. Aroma de rosa e sândalo invade suas narinas. Ele percebe que as dores o abandonaram. O lugar outrora molhado estava seco. O teto apresentava, agora, pinturas perfeitas sobre o céu dos anjos.

Thiago tem a sua atenção chamada pela luz na porta. Do mesmo lugar de onde vinha o som que evocava seu nome. A luz clara, intensa e acolhedora se aproxima. Começa a se revelar, com a proximidade, o contorno de um rosto belo e tranquilo. O leve som de bater de asas é ouvido.

Thiago olha para trás e se vê. Chora. Sente no seu novo ser um abraço quente e no seu coração a calma que uma vida inteira de sofrimentos jamais provou.

Thiago dorme calmamente.

Autor:
Simone da Silva Figueiredo
(escrito em 31/8/2011)

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Paola

Paola ouve música no rádio. Zapeia pelas estações pulando as notícias e as propagandas. Dança no compasso daquelas que somente ela escuta. A música berra em seus ouvidos. Os fones parecem que vão explodir.

Paola aprecia a todos que a observam em sua loucura particular. Vasculha os olhares e lê as mentes à procura de alguém. Procura por outro insano como ela. Tem de ser um insano belo. Os feios estão a salvo.

Paola é uma morena de um metro e oitenta de altura e olhos verdes. Seus olhos amendoados e sua boca carnuda lhe conferem uma beleza impar. O seu corpo esguio não revela a força que Paola tem, pelo contrário, lhe confere uma certa aura de fragilidade. Ela usa isso a seu favor.

Paola encontra um olhar especial na multidão. Uma mariposa especial na nuvem. Enxerga um brilho azul sobressaindo na pele alva da face aquilina. Paola o escolhe e inicia um jogo de simulações. No jogo a presa se enxerga como caçador. A presa se aproxima de Paola.

Paola olha, sorri e sai do metrô. O belo estranho, a linda presa, a segue. Paola levemente diminui o passo para que o belo a alcance. Ela aprecia o jogo. Aumenta as passadas para que ele também o faça. Completando assim a conexão. Fechando o nó entorno da presa.

Paola sai da estação e ruma em direção a um conjunto de vielas e becos escuros. Ermo e sombrio os qualificam. Não é lugar para uma moça linda e comum, mas Paola é especial. O belo a segue e a encontra numa das curvas esperando por ele.

_ Você demorou.
_ Você é muito rápida. Sou Lucas.
_ Sou Paola, o que deseja?
_ Saber que música você escuta e a marca do seu batom?
_ Escuto 'Sympathy for Devil' e o batom não sei.

Paola pensa:
"Errei. Outro hedonista homossexual. Vou continuar com fome."

Largou o belo no meio do beco e foi assaltar um banco de sangue.

Autor:
Simone da Silva Figueiredo
(escrito em 01/09/2011)

domingo, 4 de setembro de 2011

Pós Doctor

Daniela recebe uma carta. A universidade que ela almeja a convida para fazer o 'Pós Doctor'. Tudo estaria do jeito que ela sonhara, instituição, bolsa, amigos, país. No entanto, há seis meses sua mãe ia e vinha do hospital. Uma internação após a outra. CTI, massageador cardíaco, prolongação da vida se tornaram expressões cotidianas. Como unir o sonho e o pesadelo? Como o sonho ocorre neste momento?

Na casa silenciosa, um ritmo diferenciado no monitor cardíaco informa à Daniela, algo foge do normal. Sobe as escadas às pressas, mas tenta se acalmar na porta do quarto da mãe. Entrou. Sua mãe, em meios aos tubos, a observa. Chama e convoca à aproximação com um olhar. Daniela se aproxima e a questiona sobre como estaria se sentindo. A mãe pega na mão dela e se despede, pedindo antes: "Seja feliz e faça tudo que tiver de fazer para isso".

Daniela escreveu para a instituição explicando a situação, cuidou do enterro e dos próprios documentos. E apesar da dor, três dias após o sepultamento, Daniela fechou o apartamento e zarpou rumo ao conhecimento. Viajou de preto.

No novo país foi bem recebida pelos velhos amigos e novos. Todos cientes de sua perda se concentravam em tornar tudo mais fácil para ela. O tempo passou. Os estudos apertaram. Daniela passava cada vez mais tempo estudando, tempo com os livros.

Certa noite, sente necessidade de um livro às 20:30 horas. Corre à biblioteca, com a certeza da inutilidade do ato. A biblioteca fechava às 20 horas. Para sua surpresa a porta da biblioteca estava aberta.

Daniela entra e encontra uma jovem bibliotecária. Sente por ela uma afeição inexplicável. A bibliotecária muito competente a ajuda. Dias se passam e Daniela passa a habitualmente utilizar a biblioteca no horário noturno, com a desculpa de ser mais tranquilo. A verdade é que se afeiçoara à bibliotecária.

Tudo correu bem. Daniela terminou o 'Pós Doctor' e voltou ao Brasil. Reabriu o apartamento, e com a calma que os quatro anos ausentes propiciou, arrumou os pertences da sua mãe. Viu as roupas, objetos de arte, jóias e achou uma caixa de fotos. Pensou, vou ver como minha mãe era quando jovem. Só lembro do rosto da minha mãe a partir dos meus sete anos, ela com cinquenta.

A maioria das fotos eram de sua mãe com ela. Já estava perdendo as esperanças quando achou um envelope escrito: "Formatura em Biblioteconomia - Turma de 1956". Um sorriso invadiu seu semblante. Abriu o envelope e viu a foto. Agora, com o espanto estampado na face, vê a bela jovem bibliotecária do seu 'Pós Doctor' ao lado de seu avô. Lê o nome de sua mãe no verso. Entendeu que nunca se separaram.

Autor:
Simone da Silva Figueiredo
(escrito em 05/09/2011)

Nasce o segredo

Era um dia como outro qualquer para muitos, para Simone era um dia especial. Após quarenta e duas semanas carregando um tesouro, tudo indicava que o segredo seria revelado. Acordou às nove horas de uma manhã ensolarada de janeiro, era o vigésimo sexto dia do ano de 2002. Ao acordar, sentiu um incômodo no baixo ventre, uma leve dor intermitente. Lembrou-se: ainda não comprei a banheira.

Concentrou-se em colocar o incômodo e a dor crescente trancados num canto de sua mente. Levantou-se e preparou o café. Tudo o mais estava arrumado: quarto, berço, lençóis, carrinho, mala, etc. Faltava a banheira, lembrou-se novamente.

Acordou o amor, comunicou que o café estava na mesa e que o curso da vida gritava em seu ventre. O amor se assustou, mas ela o acalmou, dizendo que tudo estava bem. Apressou-se em verificar as trancas no canto de sua mente.

Tomou o último café da manhã calmo ao lado do amor e saíram para comprar a banheira. Na loja, a horda de desconhecidos se aproximava. Queriam tocar o protuberante abdômen, declamar profecias e ditar receitas infalíveis. Ela somente tinha dois desejos: sentar e a banheira; e não necessariamente sabia a ordem dos desejos.

Saíram da loja para a Maternidade. A dor foi pungente. A criança estava enrolada em seus cordões. Duas voltas no pescoço. Mas, tudo bem. Às quinze horas e doze minutos, nasceu Luiza, mamãe e papai.

Autor:
Simone da Silva Figueiredo
(escrito em:27/08/2011)

Poesia - Amantes III

Oi
estou no lugar de sempre
você vai poder jantar?

...

Oi
estou no lugar de sempre
e hoje você vai dormir?

...

Oi
estou no lugar de sempre
que horas você precisa acordar?

...

Bom dia!


Autor:
Simone da Silva Figueiredo
(escrito em 20/08/2011)

Poesia - Amantes II

Bom dia, João! ................... Bom dia, Joana!
Bom dia, Paulo! .................. Bom dia, Paula!
Hora da Escola! .................. Hora da Escola!
Já calçou o tênis? ............... Penteou os cabelos?
Vamos embora para ................ Vamos, o carro
não se atrasar. .................. chegou.

................... Tic, Tac,
.......................Tic, Tac,
..........................Tic, Tac,
............................Tic, Tac

.......................Ai que saudades!
.......................Como foi o seu dia?
.......................Pena que temos pouco tempo.
.......................Me esperam em casa.

...............................UFA!
.............................Foi bom.

...............................Te Amo,
...............................Tchau!

Autor:
Simone da Silva Figueiredo
(escrito em 20/08/2011)

Poesia - Amantes I

Queria dar beijinhos em você
Como em medalha de padroeiro
que carrego junto ao peito

Queria lhe fazer afagos
como em gato de armazém

Mas, me contento em estar
no seu cotidiano
como parte de suas memórias
ou de seus esquecimentos.

Autor:
Simone da Silva Figueiredo
(escrito em 20/08/2011)

Poesia - Cotidiano

Amor são 5 horas
Hora de levantar.

Amor são 5 e meia
Tenha um excelente dia!

...
Silêncio barulhento
...

Oi amor já são 5 horas?
Você chegou mais cedo.
Que saudade!

Autor:
Simone da Silva Figueiredo
(escrito em 20/08/2011)

O passeio

Laura chegou na cidade à noite. Caminhava por vielas mal iluminadas e mal cheirosas. Chegou no lado podre da cidade. As ruas, nesta parte, eram habitadas por ratos gigantescos. Andavam num transitar frenético uma equipe do prazer mundano. Por lá se encontravam, com todos os sentidos que este verbo pode conter, prostitutas e cafetões, ladrões e assassinos, traficantes e viciados.

Laura avista uma luz ao mesmo tempo em que a musica desconexa invade seus ouvidos. Laura entra no inferninho. Moças em trajes sumários dançam. Garçons servem drinks coloridos e esquisitos. Fumaça de todo o tipo de cigarro perfuma o ambiente. Neste momento, Laura vê Marcelo.

Marcelo é um rapaz elegante, alto e com os piores 27 anos já relatados. Marcelo está com uma moça em seu colo enquanto outra dança para seu deleite. Uma terceira moça lhe traz uma bandeja. Nela e possível ver as carreiras de pó branquíssimo. Marcelo as inala. Rapidamente entra num estágio de euforia exagerada. As órbitas oculares aumentam de tamanho e ele transpira exageradamente. Em poucos minutos começa a sair pelos cantos de sua boca uma baba branca e viscosa. A língua despenca como se fosse uma gravata.

Laura pacientemente assiste a tudo. Marcelo se levanta não compreendendo a ausência repentina da excitação e da música. O odor do cigarro não mais existe. Tudo ao redor de Marcelo se torna um borrão. Marcelo enxerga Laura. Vê a moça alta, elegante, loira e de pele alva. A moça linda o enxerga. Ele a percebe com clareza, diferente de todo o resto. Marcelo caminha em direção a Laura.

Marcelo interpela Laura como se ela tivesse todas as respostas para as dúvidas que brotaram em sua mente. Laura calmamente levanta-se e caminha para fora. Marcelo a segue.

Do lado de fora, em meio à noite e ao lugar fétido. Marcelo agarra o pulso de Laura. Ela se volta e olha dentro dos olhos, colocando dentro da mente dele um filme dos seus 27 anos dedicados à devassidão. Laura o beija e suga o resto das suas dúvidas acerca da vida, plantando em seu coração a certeza da morte.

Marcelo chora. Laura o abraça e o eleva. Caminham juntos rumo a escuridão formada por aqueles que não tem luz.

Autor:
Simone da Silva Figueiredo
(escrito em 31/08/2011)

Saudade

Atualmente sinto saudades. Sinto saudades do que vivi há muito tempo e do que aconteceu ontem. Sinto saudades do meu pediatra e do meu cardiologista. Sinto saudades de um ursinho de plástico que tinha aos 3 anos e que pintei com a minha coleção de esmaltes. Sinto saudades do livro que terminei de ler na semana passada.

Por anos não senti saudade. A vida era uma seqüência de fatos com intervalos tão curtos que a saudade não tinha tempo para se manifestar.

A saudade, que sinto atualmente, tem personificação. Mora no museu das minhas memórias. Nos tempos apressados de outrora, ela era um quadro guardado no estoque, por não estar de acordo com o tema exposto. Hoje, a saudade, é uma senhora de abdômen globoso.

Neste ponto preciso fazer uma retificação, ou uma nova orientação, para o desenvolvimento deste texto, que me atrevo chamar de relato. A saudade tem de passar do nome apenas de um sentimento para o nome de um personagem. O verbete precisa trocar o ‘s’, este deixará de ser tratado em minúsculo e passa para maiúsculo. Saudade é nome.

Saudade é a senhora que reside no museu das minhas memórias. Saudade, uma senhora redonda, passeia pelo museu. Por estes dias esta sentada no saguão, a informar a todas de sua existência.

Por vezes, a noite, ela faz a ronda dos salões. Pensa que está no Louvre e procura obras raras, pensamentos guardados. Apega-se a tudo que é importante, como tive amores. Busca peças no estoque e as expõem nos salões. Tenho encontrado tantas fotos, cartas e lembranças. Com todo esse exercício a Saudade se cansa, então senta. É quando sinto um aperto no peito e muita dificuldade de respirar. Ainda bem que ela sempre levanta.

O que faço quando ela não mais levantar?

Autor:
Simone da Silva Figueiredo
(escrito em 01/09/2011)

Encontro

Estamos no vigésimo sexto dia do mês de agosto no ano de nosso Senhor de dois mil e onze. Estou oficialmente a seiscentos e trinta e três dias separada. São quase dois anos sem um corpo másculo e quente ao meu lado diariamente. Sinto falta.

Ao terceiro dia deste mês conheci um senhor. Sua alcunha é um segredo que não revelarei. Fomos a uma exposição, a um restaurante e caminhamos a pé pelo centro da cidade. Na chuva dividíamos animadamente uma pequena sombrinha. O que serviu para nos aproximar mais. Apesar da insanidade confirmada que é confiar em alguém recém conhecido, não consegui agir diferente. Quando voltei a me confrontar, a lembrar de minha própria existência, as nossas bocas já estavam unidas. E por minutos, que a inconsciência do entorno não me permite precisar a quantidade, trocamos beijos cheios de paixão e luxúria.

Esta, da minha parte, a luxúria, vinha trazida pela visão do belo espécime masculino ao meu lado adicionado pelo longo período sem sentir o prazer desse tipo de toque.

Nesse momento percebo que todo e qualquer resquício de racionalidade me abandonou. E aconteceu em concomitância com o repouso de suas mãos másculas e quentes na porção final de minha coluna. Nada mais a frear. Nenhum pensamento racional me envolvia. Me deixei levar.

Autor:
Simone da Silva Figueiredo
(escrito em 26/08/2011)